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PGR admite desempenho abaixo do esperado e propõe medidas para combater crimes em Moçambique


Em sua apresentação anual na Assembleia da República, o Procurador-Geral da República (PGR) de Moçambique, Américo Latela, reconheceu que o desempenho da Procuradoria-Geral da República não atingiu os níveis projetados, apontando a exiguidade orçamental como principal obstáculo. Durante o discurso, Latela detalhou os desafios enfrentados pela instituição e propôs medidas para fortalecer o combate a crimes como homicídios voluntários, raptos, tráfico de pessoas e criminalidade organizada, além de defender maior autonomia financeira para o Ministério Público.

Latela foi enfático ao destacar que as restrições financeiras têm comprometido as funções essenciais da PGR. “Senhores deputados, excelências, o desempenho da nossa instituição não tem correspondido aos níveis previstos nos nossos planos anuais, devido à exiguidade orçamental, o que tem afectado consideravelmente o alcance dos objectivos institucionais, o controlo da legalidade, a direcção efectiva da instrução preparatória, o exercício da acção penal e a defesa dos interesses que a Lei determina”, afirmou.

Para superar esse entrave, o Procurador-Geral defendeu a criação de um modelo que garanta autonomia financeira aos órgãos da administração da justiça, com foco no Ministério Público, permitindo maior flexibilidade na execução de suas actividades. Ele também destacou esforços de modernização, como o desenvolvimento de um sistema de informação para gestão processual, que visa melhorar a eficiência e eficácia dos serviços do Ministério Público.


Um dos pontos centrais do informe foi o aumento dos crimes de homicídio voluntário, que, segundo Latela, reflete um “desrespeito pela vida” e exige uma reflexão coletiva. “No ano de 2024 registamos um total de 1.566 processos de homicídios voluntários, contra 1.390 do ano anterior, verificando-se um aumento de 176, correspondentes a 12.7 por cento”, revelou, destacando as províncias da Zambézia, Tete e Manica como as mais afetadas, com 446, 208 e 189 processos, respectivamente.

Latela expressou preocupação especial com casos de violação de mulheres seguida de assassinato na cidade da Beira, Província de Sofala, descritos como “bárbaros e hediondos”. Para enfrentar o problema, a PGR, em coordenação com autoridades de segurança, implementou ações preventivas, incluindo estratégias de segurança individual e coletiva e mecanismos céleres de denúncia, envolvendo potenciais vítimas.


O tráfico de pessoas e de órgãos humanos também foi abordado. Em 2024, foram registrados cinco processos de tráfico de pessoas, um aumento de três em relação ao ano anterior, com casos em Maputo, Cabo Delgado, Tete, Manica e Gaza. Quanto ao tráfico de órgãos, quatro processos foram instaurados, contra cinco no período anterior, com dois resultando em acusação e quatro transitando para 2025.

Latela apontou a vulnerabilidade socioeconômica e o uso indevido das tecnologias de informação, especialmente a internet, como fatores que complicam o combate a esses crimes. “A internet constitui a nova arma dos traficantes por oferecer inúmeras possibilidades para recrutamento de vítimas”, alertou. Para enfrentar o problema, a PGR está articulando com provedores de telecomunicações e empresas de tecnologia a criação de um website público com informações para conscientizar grupos vulneráveis, como crianças e jovens, sobre os riscos online.

O Procurador-Geral defendeu ainda a revisão da Lei de Tráfico de Pessoas, alinhando-a ao Protocolo de Palermo e à legislação penal vigente, proposta que está no Ministério da Justiça desde 2023.


No combate aos raptos, Latela reconheceu avanços, mas destacou desafios significativos, especialmente na província de Maputo, onde o crime gera insegurança entre agentes económicos. “No período em análise, foram Próspero foram instaurados 32 processos, contra 60 de igual período anterior, verificando-se uma redução de 28 processos, correspondente a 46,7 por cento”, informou. Em 2024, 13 vítimas foram resgatadas, 21 suspeitos detidos, seis armas apreendidas e três cativeiros desmantelados.

Apesar desses esforços, a identificação e neutralização dos mandantes permanecem difíceis devido à sofisticação das redes criminosas e ao fato de muitos operarem fora do país, principalmente na África do Sul. “Esses [mandantes] muitas vezes encontram-se fora do país, o que nos remete incondicionalmente à cooperação internacional”, afirmou Latela, destacando a lentidão dos mecanismos de cooperação, que exige celeridade.

Para fortalecer o combate, Latela enfatizou a necessidade de recursos humanos qualificados, meios técnicos, táticos e tecnológicos especializados, além de uma revisão da lei do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) para torná-lo mais eficaz. O procurador-geral da República, Américo Letela, sugeriu que sejam congeladas as contas das vítimas de rapto, de suas empresas e de familiares próximos, para evitar o pagamento do resgate e desencorajar este tipo de crime.


Latela propôs a introdução do instituto de direito premial no ordenamento jurídico moçambicano, um mecanismo que permitiria acordos entre órgãos judiciários e infratores que confessassem crimes em troca de punições mais brandas ou suspensão de processos, desde que denunciassem outros envolvidos. “Entre os principais benefícios desta figura, aponta-se a descoberta de verdade material, que facilita o esclarecimento de crimes, a possibilidade de atenuação das penas, incentivando a colaboração com as investigações e a protecção pessoal do colaborador”, explicou, destacando que isso poderia acelerar a tramitação processual e aumentar a eficácia do sistema de justiça.


O Procurador-Geral concluiu apelando por uma união de esforços entre todos os setores da sociedade para prevenir crimes e proteger a vida. “O aumento do desrespeito pela vida, que propicia crimes de homicídio voluntário, demanda uma reflexão conjunta sobre as medidas sociais de prevenção, envolvendo todos os seguimentos da sociedade, incluindo as entidades especializadas na protecção dos direitos humanos”, afirmou, reforçando a necessidade de estratégias que priorizem a segurança e o bem-estar dos cidadãos.

A apresentação de Latela na Assembleia da República gerou expectativas sobre as medidas a serem adotadas para fortalecer a PGR, garantir autonomia financeira e enfrentar os desafios da criminalidade em Moçambique, em um contexto de crescentes demandas por justiça e segurança pública.

Redação: Índico Magazine || Junte-se ao canal 🌐 ÍNDICO MAGAZINE 🗞️📰🇲🇿 no WhatsApp: https://whatsapp.com/channel/0029VafrN6E8aKvAYGh38O2p