O político moçambicano e ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane poderá ser condenado a uma pena de até 20 anos de prisão, caso o tribunal considere procedente a acusação de terrorismo que lhe foi imputada hoje (22) pelo Ministério Público. O processo insere-se no âmbito das investigações sobre as manifestações populares pós-eleitorais, que abalaram o país entre outubro de 2024 e março de 2025, resultando, segundo organizações da sociedade civil, em cerca de 400 mortes e vastos prejuízos materiais.
Segundo o Código Penal moçambicano, concretamente o Artigo 382, o crime de terrorismo é punível com prisão maior de 16 a 20 anos nos casos em que haja atos destinados a criar terror, insegurança ou desestabilização social, incluindo incitação pública a tais ações. A legislação ainda prevê agravantes caso haja associação com homicídios ou destruição em massa, o que pode conduzir à aplicação de penas cumulativas.
Mondlane foi formalmente acusado de cinco crimes, entre os quais constam incitamento à desobediência coletiva, instigação ao terrorismo e perturbação da ordem pública. O político compareceu à Procuradoria-Geral da República (PGR) na cidade de Maputo para ser notificado, numa sessão realizada sob forte aparato de segurança, que incluiu restrições à circulação nas imediações da instituição.
À saída da PGR, Mondlane rejeitou todas as acusações, afirmando tratar-se de uma tentativa de silenciamento político: “Pelo contrário, eu prestei um grande serviço a esta nação. Estou de consciência tranquila”, declarou, garantindo que está a ser assistido por uma equipa internacional de advogados e que continuará a lutar pela “libertação democrática do povo moçambicano”.
Mondlane tem sido uma das figuras mais ativas da oposição desde as eleições gerais de 9 de outubro de 2024, nas quais não reconheceu a vitória de Daniel Chapo, candidato da FRELIMO. Em resposta, liderou uma série de protestos em diversas cidades do país, contestando os resultados e denunciando alegada fraude eleitoral.
Durante esses protestos, ocorreram confrontos entre manifestantes e forças policiais, culminando em centenas de mortos, saques e destruição de infraestruturas públicas e privadas, conforme relatórios de organizações como a Human Rights Watch e a Liga Moçambicana dos Direitos Humanos. O Ministério Público sustenta que Mondlane teve um papel central na mobilização e radicalização das massas, o que configura, segundo a acusação, “instigação ao terrorismo”.
Apesar da gravidade das acusações, o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo aplicou apenas o Termo de Identidade e Residência como medida de coação, permitindo que Mondlane responda ao processo em liberdade.
A Lei n.º 5/2018, revista em 2022, prevê igualmente penas de até 24 anos de prisão para quem instigar ou recrutar indivíduos para atos terroristas, bem como entre 12 a 16 anos para quem divulgar mensagens que incentivem tais atos. As acusações de Mondlane podem, portanto, enquadrar-se em múltiplas frentes legais.
Enquanto isso, organizações como o MISA-Moçambique e o Comité de Proteção de Jornalistas já expressaram preocupação com a forma como estão a ser tratados os casos ligados às manifestações, alertando para riscos à liberdade de expressão e à utilização indevida das leis antiterrorismo para fins de perseguição política.
Analistas políticos dividem-se entre os que veem o caso como uma resposta legítima do Estado diante de ações potencialmente violentas e os que consideram que se trata de um “julgamento político disfarçado de processo penal”, num ambiente de crescente tensão entre o governo e setores dissidentes da sociedade.
Mondlane permanece em Maputo sob vigilância, tendo sido escoltado até sua residência após a notificação. O caso promete agitar ainda mais o já delicado cenário político moçambicano e poderá ser um divisor de águas sobre os limites entre protesto político e crime de segurança nacional.
Redação: Índico Magazine