Venâncio Mondlane só pode ser julgado pelo Tribunal Supremo, por gozar de imunidade como membro do Conselho de Estado
Apesar de enfrentar acusações graves, incluindo incitamento ao terrorismo, Venâncio Mondlane, ex-candidato presidencial e figura central nas manifestações pós-eleitorais de 2024, só poderá ser julgado pelo Tribunal Supremo. A imunidade de que goza decorre da sua posição no Conselho de Estado, órgão político de consulta do Presidente da República.
![]() |
Adelino Muchanga, Presidente do Tribunal Supremo. |
A Lei n.º 5/2005, que regula o funcionamento e os estatutos dos membros do Conselho de Estado, estabelece claramente que estes conselheiros têm foro privilegiado. Segundo o artigo 15 da referida lei, “nenhum membro do Conselho de Estado pode ser detido ou preso sem autorização do Conselho, salvo em caso de flagrante delito e se o crime for punível com pena de prisão maior.” Adicionalmente, a mesma norma estipula que “o membro do Conselho de Estado goza de foro especial e é julgado pelo Tribunal Supremo.”
Venâncio Mondlane passou a integrar o Conselho de Estado por inerência constitucional, por ter sido o segundo candidato mais votado nas eleições presidenciais de outubro de 2024. A primeira reunião do órgão com a nova composição ainda não teve lugar, mas a sua nomeação confere-lhe automaticamente imunidade judicial, até deliberação em contrário do próprio Conselho.
![]() |
Venâncio Mondlane, ex-candidato presidencial nas eleições de 2024 e segundo candidato mais votado, segundo dados promulgados pelo Conselho Constitucional. |
O Ministério Público acusa Mondlane de cinco crimes, todos com moldura penal superior a 20 anos de prisão efetiva: apologia pública ao crime, incitamento à desobediência coletiva, instigação pública a um crime, instigação ao terrorismo e incitamento ao terrorismo. Segundo a acusação, estes atos foram cometidos através de declarações públicas e transmissões ao vivo nas redes sociais, nas quais o político apelava à contestação dos resultados eleitorais e à mobilização popular.
“Os factos praticados pelo arguido colocaram em causa, de forma grave, bens jurídicos fundamentais, tais como a vida, a integridade física e psíquica das pessoas, a liberdade de circulação, a ordem, segurança e tranquilidade públicas, bem assim o normal funcionamento das instituições”, argumenta o Ministério Público no despacho entregue na Procuradoria-Geral da República.
Contudo, qualquer desenvolvimento processual contra Mondlane dependerá agora da autorização do Conselho de Estado. Ainda que as acusações sejam graves, a Constituição e a legislação vigente atribuem proteção especial aos conselheiros, tornando o Tribunal Supremo o único órgão competente para julgar o caso.
Organizações da sociedade civil alertam que o processo pode ter motivações políticas, apontando o risco de instrumentalização do sistema judicial para afastar opositores. Já Mondlane, por sua vez, nega as acusações e acusa o Presidente Daniel Chapo de “desonestidade intelectual” e de “beneficiar de um processo eleitoral manipulado”.
Desde as eleições de outubro, o país registou uma onda de protestos, paralisações e confrontos com as forças de segurança. Estima-se que cerca de 400 pessoas tenham morrido nesse contexto, segundo dados de organizações não-governamentais.
Redação: Índico Magazine|Fonte: Lusa