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Conselho Constitucional (CC), através da sua presidente, juíza-conselheira
Lúcia Ribeiro, esclareceu esta semana a questão das incompatibilidades no exercício simultâneo de funções pelo Presidente da República, Daniel Chapo, que acumula o cargo de Chefe de Estado e de presidente do partido FRELIMO. Em conferência de imprensa, Ribeiro afirmou de forma categórica que a Constituição da República é clara:
o Chefe de Estado não pode exercer outras funções, públicas ou privadas, salvo as exceções expressamente previstas na própria Lei Fundamental.
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Lúcia Ribeiro, presidente do Conselho Constitucional. |
Segundo a juíza-presidente do CC, não há espaço para interpretações que flexibilizem a norma. “O artigo 148 da Constituição dispõe claramente que o Presidente da República não pode, salvo nos casos expressamente previstos na Constituição, exercer qualquer outra função pública e, em caso algum, desempenhar quaisquer funções privadas”, declarou Lúcia Ribeiro.
A magistrada explicou ainda que, no âmbito processual, o Conselho Constitucional não admite a introdução de mecanismos estranhos ao processo constitucional. “O caráter subsidiário das regras processuais civis ao processo constitucional só existe quando se está perante uma lacuna. Não se aplica nos casos de silêncio do legislador ou falta de regulamentação de matérias. O processo constitucional, devido à sua especificidade, não admite articulado para além da petição inicial e da contestação”, disse Ribeiro, frisando que qualquer tentativa de introduzir novas figuras jurídicas é proibida.
No entender do CC, este rigor processual é fundamental para garantir a legitimidade das suas decisões. “Não há lugar à resposta à contestação no processo relativo às incompatibilidades previstas na Constituição ou na lei. Encerrada a análise das presunções processuais e vencidas as questões prévias, cumpre apreciar e decidir o mérito da questão apresentada”, acrescentou a presidente do órgão.
Sobre a matéria em análise, Ribeiro enfatizou que a dúvida jurídica não se prende com a natureza dos partidos políticos, mas sim com o impacto profundo da questão no sistema político moçambicano. “Apesar da sua singela colocação, a questão não é despicienda. De relance, poderia induzir no sentido de que a resposta estaria ancorada na qualificação da natureza jurídica dos partidos políticos. Longe disso. Trata-se de um aspecto com profundo enraizamento na sociedade, pois convive com o Estado desde a sua fundação”, afirmou.
Deste modo, a presidente do Conselho Constitucional reiterou que a Constituição não abre margem para o exercício de dupla função pelo Chefe de Estado. “A regra é clara e deve ser cumprida. O Presidente da República não pode exercer, em simultâneo, o cargo de presidente de um partido político. A nossa responsabilidade é assegurar que a supremacia da Constituição seja respeitada”, concluiu Lúcia Ribeiro.
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Daniel Francisco Chapo, presidente da República de Moçambique e presidente da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) |
A posição do CC poderá reconfigurar o debate político em Moçambique, num contexto em que Daniel Chapo, eleito em 2024, assumiu simultaneamente a liderança da FRELIMO e a Presidência da República. O pronunciamento da mais alta instância constitucional coloca pressão sobre a necessidade de clarificação da relação entre o Estado e os partidos políticos, questão central na jovem democracia moçambicana.