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Reprodução da imagem Índico Magazine |
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Associação Rede dos Direitos Humanos (ARDH) formalizou, na passada sexta-feira, uma queixa-crime pública contra o deputado da FRELIMO, Egídio G. Vaz Rapouso, na Procuradoria-Geral da República (PGR). O documento acusa o parlamentar de incitação ao ódio e à violência, apologia pública de crime e incitação pública a um crime, com base em uma declaração polêmica feita nas redes sociais, que faz referência direta ao assassinato do advogado Elvino Dias, ocorrido há quase um ano.
A queixa, apresentada pelo mandatário judicial da ARDH, Dr. Sérgio Azarias Matsinhe, invoca artigos do Código de Processo Penal moçambicano (284.º e 287.º) e o artigo 79.º da Constituição da República, argumentando que os factos configuram crimes graves de interesse coletivo. Representando uma ação penal pública, o pedido visa a defesa de direitos fundamentais como a vida, a integridade física e a dignidade humana, consagrados na Constituição e em tratados internacionais ratificados por Moçambique, como a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.
Os factos remontam a uma publicação no Facebook da página oficial de Egídio Vaz, datada de um período próximo ao assassinato brutal de Elvino Dias e Paulo Guambe, em 19 de outubro de 2024, no centro de Maputo. Dias, conhecido como "advogado do povo" e conselheiro jurídico do candidato presidencial Venâncio Mondlane (pelo PODEMOS), foi alvejado com cerca de 25 tiros, ao lado de Guambe, mandatário da campanha. O crime, que gerou comoção nacional e condenações internacionais, incluindo da União Europeia, é visto por muitos como o estopim de perseguição política em meio às tensões eleitorais de 2024.
Na postagem em questão, Vaz escreveu: "Podem falar, podem rebolar, doa a quem doer a Frelimo vai se manter por mais 50 anos. Mesmo que tenhamos que eliminar mais 50 Elvinos, não vamos hesitar... não vamos recuar." A ARDH classifica esta declaração como uma incitação direta a homicídios contra opositores políticos, revelando "animus necandi" (intenção de matar) e violando princípios constitucionais de paz, democracia e pluralismo político (artigos 3.º e 74.º da CRM).
A associação anexou capturas de ecrã como prova e requer a quebra da imunidade parlamentar de Vaz, nos termos do artigo 173.º da Constituição, argumentando que os atos são "estranhos ao exercício de funções parlamentares". Sem essa medida, o processo não avançaria, dada a proteção constitucional aos deputados.
A queixa enquadra o comportamento de Vaz nos artigos 191.º (incitação ao ódio e à violência), 345.º (incitação pública a um crime) e 346.º (apologia pública de um crime) do Código Penal moçambicano, aprovado pela Lei n.º 24/2019. A ARDH cita jurisprudência do Tribunal Supremo e do Conselho Constitucional, que exclui da liberdade de expressão (artigo 47.º da CRM) discursos que incitem à violência ou discriminação. Internacionalmente, invoca os Princípios de Camden (2009) e decisões da Comissão Africana dos Direitos Humanos, que condenam retórica de ódio.
"Esta ação visa proteger a democracia moçambicana de ameaças internas. A FRELIMO, como partido no poder, não pode usar a imunidade para blindar discursos que promovem a eliminação física de adversários", afirmou Dr. Matsinhe, em declaração à imprensa. A ARDH pede ainda diligências como preservação de provas digitais, inquirição de testemunhas e perícia informática nas redes sociais.
Este episódio surge num contexto de investigações paralisadas sobre o assassinato de Dias e Guambe. Em junho de 2025, o Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) alertou para o risco de destruição de provas, enquanto a PGR admitiu "muitas especulações" em abril, sem avanços concretos. Analistas veem a queixa da ARDH como um teste à independência da justiça moçambicana, especialmente sob o novo Governo de Daniel Chapo.
A PGR tem 10 dias para decidir sobre a admissibilidade da queixa, podendo solicitar à Assembleia da República a suspensão da imunidade de Vaz. Caso proceda, o processo pode resultar em penas de até 8 anos de prisão, dependendo da qualificação dos crimes.